27 julho 2007

Ninguém no PAN. Por quê?

Roberto Moraes Pessanha
Professor do CEFET Campos
e-mail:
moraes.rol@terra.com.br

Campos não tem nenhum atleta participando dos jogos Pan-Americanos. Seria um fato natural se não fosse o tamanho da nossa população e do nosso orçamento. Verdade que a maioria dos cinco mil municípios brasileiros também não têm, porém, nós, além de sermos um dos dez maiores orçamentos temos uma tradição esportiva reconhecida.

Mesmo com alguns questionamentos sobre o tamanho dos investimentos nestes mega-eventos, ainda consigo ver neles retorno, especialmente naqueles que ficam para o nosso povo. Mais do qualquer um outro, o pessoal da área sabe que é da massificação dos esportes que você filtra os melhores para as competições nas equipes que são chamadas de altamente competitivas.

Campos em passado recente já gastou um bom dinheiro com estas equipes. Trouxe atletas já formados e até alguns consagrados em equipes de vôlei e basquete, masculino e feminino. A pergunta que você já deve estar fazendo é sobre o que restou deles, além de uma série de processos judiciais que o contribuinte está pagando até sem saber.

Um projeto de longo prazo pode reverter este quadro. O primeiro passo é a massificação com a ampliação e organização da prática dos esportes nas escolas, nos bairros, nas praças, etc.

A construção e melhoria dos espaços para a prática incluindo um centro de esportes, onde os destaques poderiam ser mais bem apoiados do que com as atuais, vergonhosas e muitas vezes insuficientes, apoio para viagens e competições que hoje se pratica.

Já existe hoje na cidade, uma massa crítica considerável de gente especializada nas mais diferentes modalidades esportivas. Há gente interessada em montar projetos sérios, de médio e longo prazo. Há estudantes adolescentes e jovens espalhados em nossas periferias sedentos de uma oportunidade para se dedicar a algo, que possa não só fazer crescer sua auto-estima, como projetá-lo no cenário desportivo do estado e do país.

A seleção e a filtragem dos melhores e de maior potencial é tarefa natural que não exclui a preocupação com a formação cidadã do jovem que poderá seguir outros caminhos tendo o esporte, apenas como um apoio de sua saúde, de afirmação e de inclusão social.

Enfim, nesta área também precisamos de planejamento, organização, seriedade e determinação para um trabalho de longo prazo. Quem sabe assim no Pan de 2015, 2019 ou 2023 o quadro seja diferente. Até lá os royalties, já nos seus estertores, poderão retornar os acertos tomados nas políticas públicas desenvolvidas com seriedade e determinação. Oxalá!

Publicado na Folha da Manhã em 27 de julho de 2007.

20 julho 2007

Lamentável, mas evitável!

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
E-mail:
moraes.rol@terra.com.br

A ocorrência de um acidente é sempre um momento triste. É compreensível que a maioria das pessoas queira mais, descobrir um culpado do que apurar suas causas. Seja no ambiente de trabalho, no lazer, nas rodovias, ou aeroportos, raramente, a ocorrência de um acidente tem uma única causa. O normal é a existência de uma seqüência de causas que leva ao acidente.

Quase sempre, a ocorrência de um acidente com graves conseqüências é precedida de pequenos incidentes, que se detectados e apurados poderiam levar à prevenção do acidente maior. Frank Bird, um estudioso das questões relativas à prevenção de acidentes mostrava numa pirâmide este processo. Na sua base ele situava os pequenos “incidentes” e no seu topo, os acidentes graves e de grandes proporções como o ocorrido com o avião da TAM em São Paulo.

Esta análise não tem nada a ver, com a apuração das responsabilidades civis e criminais decorrentes do acidente, onde não há como se deixar de identificar os erros com o indiciamento dos seus responsáveis. Porém, para se prevenir futuras ocorrências, o mais importante é o levantamento das causas desde as mais simples e distante, às mais complexas e próximas.

Repito: a ocorrência de acidente não é uma coisa natural. Ele é conseqüência de condições de insegurança presentes em equipamentos, processos ou pessoas que, se identificados em inspeções ou auditorias exigentes permitiriam a prevenção do ocorrido.

Aumento do fluxo de passageiros. Ampliação da quantidade de horas de vôos diárias das aeronaves. A pressão por aumento de escalas e passageiros por vôo ajudam a reduzir o custo por hora voada que justificam novas reduções de custos das passagens para criação de novas demandas, num ciclo que alguns chamam de virtuoso. Essas ações, de forma isolada ou complementar podem, de alguma forma, contribuir mesmo que secundariamente, para o aumento dos acidentes aéreos.

A duplicidade de atribuições dos órgãos governamentais de regulação como ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), Infraero, Ministério da Aeronáutica pode ser somada às possíveis causas anteriores. Há algum tempo se fala dos problemas do aeroporto de Congonhas.

Além de problemas de projeto e do adensamento populacional do entorno do aeroporto, a qualidade dos treinamentos dos pilotos são peças do dominó, que tombadas uma a uma geram o infortúnio grave. Lamentável é sempre identificar que não há como voltar ao momento anterior ao acidente. Que as famílias das vítimas tenham forças, para suportar, o peso duplo da perda prematura das vidas, assim como, da pressão da publicidade ampliada por um acidente desta proporção.

Publicado na Folha da Manhã de 20 de julho de 2007.

13 julho 2007

Moeda & moenda

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail:
moraes.rol@terra.com.br

Encontrei o argumento-título deste artigo num texto religioso. Nele, o autor, ao invés de supor uma contraposição – fato comum à maioria das teses maniqueístas das religiões - tenta demonstrar que elas podem se complementar:

“Moeda é peça que representa dinheiro. Moenda é peça que mói alguma coisa. Moeda é força que valoriza. Moenda é força que transforma. Moeda é finança. Moenda é ação. Moeda é possibilidade. Moenda é suor. Moeda é recurso. Moenda é utensílio. A moeda apóia. A moenda depura. A moeda abona. A moenda prepara. Moeda parada é promessa estanque. Moenda inerte é instrumento inútil. Moeda mal dirigida traz sofrimento. Moenda mal governada gera desastre”.

Magistral, não? Mais interessante ainda ficará se transportarmos o argumento para a realidade de nossa região que hoje vive da moeda, como no passado viveu das moendas. Releia toda o parágrafo acima, vinculando, a moeda aos atuais royalties e a moenda, ao trabalho duro que produz a cana e seus derivados, desde o engenho, às atuais usinas.

A idéia de se complementarem vale para o texto acima do Hilário Silva, mas parece impossível na realidade em que vivemos, onde a “elite branca” que antes controlava a moenda, hoje segura a moeda. Segura, puxa e não quer largar.

Temos um município em mutação, não apenas da moenda para a moeda, mas da roça para a área urbana, da rua do homem em pé, para a sala de espera do político no poder, que dono da moeda, hoje controla a moenda para espremer os que são contra a abastança dos gastos.

Moenda que depende da moeda não apenas pelo “n” no meio, mas também pelo sufixo que faz a moeda chegar ao Fundeca-n-a. O etanol tal qual a moenda que tem o “n” no meio, também depende da moeda que se faz presente pelos royaltyes do mineral do fu-n-do do mar.

Orçamento que é moeda também tem “n” no meio como inde-n-ização, que como já é voz corrente é fi-n-ita, e como tal, não deve ser estanque e nem mal gerida.

Moenda lembra escravidão e o doce mel do açúcar no engenho da casa grande e da senzala. A moeda moderna lembra plataforma, perfuração e exploração. Como a moenda, ela extrai o ouro negro dos royalties com a moeda fácil das obras superfaturadas, das inexigibilidades de licitação e do fisiologismo que escraviza e tenta esconder as novas formas de senzala.

Espero que a moeda não nos leve à moenda que tritura as facilidades da vida, afastando dos lábios, o doce recado que nos ensina a simples figura de linguagem destas duas mágicas palavras.

Publicado na Folha da Manhã em 13 de julho de 2007.

06 julho 2007

José, a análise e o analista

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail: moraes.rol@terra.com.br

José anda acabrunhado. Nem a cerveja que gosta de tomar tem saboreado mais. Na última conversa que teve no boteco com os amigos há dois meses, José disse que gostaria de ser sociólogo ou antropólogo, só para tentar compreender, o que vem se passando em nossa sociedade.

José tem batido na tecla de que alguns valores ou, estão invertidos, ou ele está vendo coisas imaginárias. Às vezes acha que a lucidez - que ainda julga manter - possa ser reflexo do distanciamento do cotidiano que propositalmente tomou. José acha que esta distância pode estar permitindo ver coisas, que outros estariam fazendo questão de não enxergar.

José segue na sua análise, mais apropriada a um botequim, que a um texto de jornal ou da academia: “o município nadando em dinheiro, obras e serviços públicos de qualidade cada vez mais duvidosas com preços estratosféricos, inexigibilidades e... o que antes era imoral hoje engorda.”

Nesta angústia José acabou se deparando com escritos do antropólogo Gilberto Velho e viu lá uma luz que poderia iluminar uma ponte que ligaria o nacional, ao regional e especialmente, ao local: “a sociedade vive um círculo vicioso que vincula a impunidade à corrupção e esta à violência.” José se entusiasmou ao ler outra observação de Velho: “vivemos um momento em que faltam ao homem público exemplos de ética e honestidade.”

Apesar de concordar sobre a necessidade de exemplos, José (embora, meio perdido, ele só acha as coisas) acha que mesmo sendo verdade o fato, de que exemplos de ética e honestidade estejam longe daqui, ainda assim, não seria o caso de buscar governos paternalistas e populistas que a procura de gente de exemplos pode levar.

José, quando analisa menos e propõe mais, diz acreditar mais, na organização da sociedade para exigir mais transparência e controle das políticas públicas, do que em discursos ou pessoas.

Ainda sobre o cotidiano José não tem entendido o por quê da Câmara Municipal ter adotado como regra de procedimento, reuniões sigilosas com autoridades, cujas ações tiveram questionamentos sobre lisuras. José fica nervoso com alguns destes assuntos e chega a discursar: “a administração é pública, os recursos são públicos, então que história é esta de conversa reservada? Se for para ser assim, porque a Casa do Povo precisaria de espaço mais amplo e garboso como o do Fórum? Para entregar títulos de cidadania, fazer homenagens e outros convescotes do gênero?”

José tem se achado um cara estranho. Está procurando analista e uma bolsa “proba” que pague esta conta. Alega que há bolsas para tudo por quê não pra cabeça? José só faz questão de lembrar que depois não aceitará chantagem de quem queira lhe insinuar: “E agora José?”

PS.:Publicado na Folha da Manhã em 06 de julho de 2007