29 setembro 2006

Carta para meu filho Caio

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail: moraes.rol@terra.com.br


Você, integrante desta nova geração, que com 16 anos, pela primeira vez exercerá o direito a voto, logo, nesta complexa eleição, já imaginou o que estará em jogo no domingo? Sei que o debate, nestes últimos dias de campanha, especialmente na classe média, foram as notícias sobre o dossiê. Ele, assim como as demais maracutaias, de todo e qualquer governante deve ser repudiada.

Lembro, porém, que numa eleição presidencial, este não pode ser o único ingrediente na decisão do voto. Não quero que abandone este critério, mas anseio que enxergue, que, enquanto o país não fizer, uma profunda reforma política, as diferenças, neste aspecto, não serão demasiadas.

Quero falar de outras coisas. Desejo sugerir outros elementos de análise, no afã, de que na fatídica escolha, eu e você sejamos movidos por uma lógica e um raciocínio que se sustentem, em meio ao mar de confusões que temos, ouvido, lido e assistido. Mais uma vez, insisto, não se trata de abandonar a ética, mas, de não se deixar levar, por quem a propala, quase como negócio de botequim. Particularmente, não acredito em quem a usa, como mercadoria de ocasião.

Vejo que o governo Lula interrompeu a agenda neoliberal, avançou nos programas sociais, na geração de empregos, na recuperação de instituições estatais e públicas, construiu uma política externa democrática e interdependente, impediu que se instalasse uma crise econômica controlando a inflação e resgatando alguns instrumentos de política de crescimento e diminuição da miséria. Mais: valorizou e retomou as contratações necessárias no serviço público, com reajustes salariais dentro do limite do possível, mas, ainda assim, imensamente maior que os, dos oito anos anteriores.

Verdade que o PT errou e frustrou muito de nossas expectativas, mas, numa análise mais racional, devemos considerar que, ao fazer como os outros, algo não desejado, não tornou o partido, pior do que os outros. Verdade também, que o PT sempre quis passar a idéia de que era puro e um partido político não é puro, ele tem defeitos. O que a sociedade e também os partidos precisam é aperfeiçoar mecanismos de controle e fiscalização. Sem hipocrisia, sabe-se que isso vale para todos.

Não desejo transformar este artigo em panfleto, aliás, você não gosta disso. Aprecia o debate e o aprofundamento em detrimento da retórica, coisa que acho, uma das boas características desta sua geração. Na verdade escrevo, não tentando te convencer, talvez sim, esteja eu mesmo querendo me convencer, sobre estas coisas que conversamos e sobre as quais temos mais concordâncias do que discordâncias.

Na verdade, externo nossas conversas, no intuito, de tentar expor publicamente a complexidade daquilo, que alguns cinicamente querem superficializar. Eu que sempre defendi a emoção, apelo agora, pela razão. A saraivada de pressões e críticas que o governo atual levou e vem levando, sem igual na história, merece reflexão, mais profunda, na medida que questiona posição sobre valores que são tão caros, a um pai que não abre mão deles, ao querer educar o seu filho.

A cientista política Alessandra Aldé, professora de comunicação e política da Uerj que há muitos anos pesquisa as campanhas eleitorais no país, disse que: “em nenhum momento anterior da política recente do país, um governo foi tão massacrado. É como se o governo não tivesse agenda positiva nenhuma. O monitoramento que o Iuperj/UFRJ faz da análise de notícias positivas e negativas deste governo, não tem similaridade com nenhum outro e isto não tem sintonia com a percepção do eleitorado, que vê diversas coisas positivas nele”.

Finalizo dizendo a você que o governo Lula vale o seu voto, não porque é vítima do quer que seja, mas porque, ele tem resultados e créditos maiores, que merece a sua opção, especialmente, diante das demais alternativas. Faça sua análise, pensando em você, mas sem deixar de pensar no país e especialmente, naqueles, que mais precisam da política. Aspiro que o seu tempo e as novas gerações sejam menos complicados e melhores.

Publicado na Folha da Manhã 29 de setembro de 2006.

23 setembro 2006

Tecnofobias imateriais ou maluquices!

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail: rmoraes@cefetcampos.br

Continuando a série do mundo de contra-cabeça. Não li na internet e sim num jornal impresso. Não foi em caderno de informática, e nem, de economia e sim, num caderno, para as mulheres. O fato: uma dupla de publicitários de Porto Alegre que apresentaram novidades, num seminário de marketing de moda ocorrido, há dois meses, em São Paulo.

A dupla diz que trabalha com pós-materialismo. A primeira reação é imaginar algo zen ou holístico. Que nada, o inverso: eles se referem ao mundo do consumo por despesas com bens que não enxergamos. Citam como exemplo, a compra de uma casa ou, de um carro que só existe no mundo virtual. Falam em sites já existentes, onde internautas gastam dez dólares, para ter uma mansão na sua outra vida: a virtual.

Calma, a loucura não pára aí. A partir da casa, seu virtual dono (ou seria dono virtual?) não importa, consideremos, o dono deste bem imaterial, contrata como decoradora, uma menina nova-iorquina que cobra, outros dez dólares, para os seus serviços. Este mercado virtual procura compradores para outros produtos.

No Vietnã (por quê o Vietnã?) um menino cria armas virtuais vendidas a três dólares. Segundo eles, já existem comunidades, em que seres virtuais, vivem suas outras vidas em casas, bairros e cidades. São pessoas que teriam, no mundo real, poucos destes bens. Não conheço, mas a dupla de publicitários fala que, o Brasil já é o quinto país em número de participantes desta rede.

A maluquice avança. Estes publicitários ao invés, de se referirem às classes de consumo como A, B, e C, dividem-na numa pirâmide de influência. As alfas globais são os criadores; as betas globais os disseminadores e mainstream, os que recebem a influência: os consumidores. Exemplo? Um programa que abaixa músicas (em MP3) com bandas alternativas.

A turma do primeiro grupo, os alfas já usam o recurso há algum tempo. Os betas ao terem acesso, logo distribuem para duzentos amigos na rede que são os mainstream. Para mostrar que os publicitários não estão na estratosfera, saibam que eles hoje, já têm como clientes: a Nokia, Grendene, Claro, Unileve, etc. Quando estudam produtos de grandes volumes, observam as reações do grupo beta e para criar, se baseiam nos do grupo alfa.

Falam ainda de consumo vazio, que é aquele em que o cara consome expectativa, de uma futura necessidade, que quase nunca se confirma. Falam mais de psicologia do que de economia e miram no grupo etário, dos dezoito aos vinte e quatro anos.

Os bens imateriais não precisa ser esta loucura toda. Tem muita coisa já real, como é o caso do home-work. As pessoas que pensam o futuro das cidades, já não se referem ao caos das metrópoles porque avaliam, que os impactos tenderão a ser menores. As pessoas que vivem nestes espaços, tenderão a demandar menos alguns serviços, que antes faziam prever um caos, como no caso do transporte e do trânsito. Pensando sobre tudo isto, eu acordo lembrando da exclusão e das discrepâncias de renda e volto a sonhar no desejo de que estas sim fossem virtuais e o restante real.

Publicado na Folha da Manhã em 22 de setembro de 2006.

16 setembro 2006

Mundo de contra-cabeça

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail: rmoraes@cefetcampos.br


A gente vai vivendo aos pouquinhos e não se dá conta de que o mundo virou de contra-cabeça. Mata-se criancinhas em nome do combate ao terrorismo. Inventa-se uma guerra porque um louco, dono de um país que tem muito petróleo, armazenaria armas para possíveis atentados.

Na tecnologia a coisa ainda é mais estranha: agora se fala por telefone sem fio para o qual inventaram o nome de celular e por outro lado, vê-se televisão, que antes era sem fio, através do cabo. Pergunta-se pelo telefone se o interlocutor viu a mensagem que mandou pela rede do orkut. Compra-se por telefone o que se vê na televisão, que antes servia apenas de veículo de propaganda.

Antes se comprava disco para ouvir música, hoje, se faz música, ouve-se, grava-se, divulga-se e vende-se música sem sair de casa. Uma bossa-nova que antes era chique de se ouvir na vitrola num canto da sala, hoje é mais apreciada no Japão e no oriente que em nosso país.

Ambulância que socorria doente, hoje socorre as campanhas eleitorais dos políticos. Come-se a quilo o que antes era aquilo. Petróleo se acha mais no mar do que em terra. Casa sem muro em espaços cercados de muros e com o nome de condomínio é coqueluche que, como outras doenças sumidas, reapareceram. Carro é quase um caminhão e trator virou carro, até com ar condicionado.

Em Campos tem-se quase um assassinato por dia, quando antes era por mês e antes ainda, por ano. O dinheiro que antes faltava e era problema, hoje sobra e é esbanjado e continua a ser problema. Tem mais faculdade que gente letrada. Tem mais médico do que gente sã. Plantam-se mais votos do que cana. Açúcar vale menos que álcool. Gás que antes servia para a cozinha serve para o carro e a cozinha dispensa o gás para ficar com o microondas que consome energia elétrica que hoje é mais cara que o aluguel da casa ou do apartamento.

Planta-se para colher combustível e combustível serve para fazer alimentos. Justiça para brigar ao invés de luta para fazer justiça. Ong para arrecadar, ao invés de voluntariar. A descentralização das políticas públicas, que antes era uma defesa quase unânime para o aumento da eficiência, agora, na educação, um de seus maiores defensores, ao inverso, quer a sua federalização.

Coleta-se células-tronco do cordão umbilical para resolução de futuros problemas de saúde dos ricos, que querem cada vez viver mais, enquanto os pobres morrem sem células e sem comida. O mundo da cultura se misturou com a religião. Atores como Darlene Glória e Jece Valadão que viraram evangélicos, agora voltaram aos seus ofícios sem testemunhos.

Cada vez mais se trabalha em casa e diverte-se no trabalho. Compram-se mercadorias com plástico, sem intermediários e sem dinheiro, pelo computador enquanto, o pobre continua de contra-cabeça, sem nenhuma mudança. Não há como não recordar o poeta Raul Seixas que por muito menos já vociferava: pára o mundo que eu quero descer!

Publicado na Folha da Manhã em 15 de setembro de 2006.

11 setembro 2006

Verdadeiramente Probo: trabalho ou estágio em troca da bolsa

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail: rmoraes@cefetcampos.br

Não há nada pior e mais vicioso do que você conceder algo do setor público sem exigência de troca, compensação ou contrapartida. A doação ou concessão, via de regra, vicia o recebedor, principalmente, se ele tem condições de oferecer algo em troca.

Não me refiro aos miseráveis que passam fome, ou aos idosos que não têm, na maioria das vezes, forças físicas para o exercício e o desenvolvimento de projetos amplos. A minha referência é feita para os milhares de jovens e adultos atendidos pelo programa de bolsas de estudos nas instituições universitárias particulares do nosso município.

Batizado pelo sugestivo e instigante nome de Probo, o programa muitas vezes questionado pelos seus critérios de concessão, merece, além de mais transparência nestes critérios, um outro tipo de aperfeiçoamento: uma contrapartida do aluno atendido.

Por exemplo, a exigência que o beneficiado atue em um “programa de caráter social” sob a forma de estágio na sua área de formação, numa carga horária de, por exemplo, 40 (quarenta) horas mensais, coordenadas, por um orientador específico para cada secretaria participante do programa, como a de saúde, educação, promoção social, indústria e comércio, esportes, etc.

Note bem, não estou falando de participação burocrática e nem de atividades desenvolvidas em escritórios. A máquina pública, neste sentido, via de regra, não tem boas coisas a ensinar. Falo de atividades práticas, tipo pé-no-chão, no barro, na estrada. Algo semelhante, ao antigo Projeto Rondon, só que dentro do próprio município.

Os resultados seriam, pelo menos, duplo: do aluno que assim conheceria mais profundamente a realidade do seu município e a do cidadão da periferia atendido em demandas e orientações que podem ajudar a mudar a sua condição social. De lambuja, a gestão municipal ganharia a ampliação dos seus tentáculos ao cidadão que, no fundo é a sua razão de existir.

Algo semelhante está sendo proposto para os alunos atendidos pelo programa Pro-Uni do governo federal, pelo deputado federal Paulo Delgado, como emenda dentro da Reforma Universitária que atualmente está sendo discutida no Congresso Nacional.

Mais e melhores resultados podem ser alcançados em programa semelhante dentro do município que, na verdade, está mais perto do cidadão a quem busca atender. Sendo assim, a idéia vale para todos os municípios da região, que com recursos dos royalties têm concedido bolsas aos seus universitários.No caso de Campos, o programa municipal poderia verdadeiramente se dizer Probo, ao usar o dinheiro que é de todos a serviço de quem mais precisa. Fica mais esta sugestão.

Publicado na Folha da Manhã em 8 de setembro de 2006.

01 setembro 2006

A sina do Goyta

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail: moraes@fmanha.com.br


Triste sina a de que é vítima o nosso Goytacaz. Falo nosso, pela tradição e pelas referências necessárias de serem mantidas, em épocas conturbadas como a atual. Viveu sempre sob a pressão do Caixa D’água-1. Este acenava com apoio dizendo defender o futebol do interior, desde que o Goytacaz se mantivesse distante do seu time de coração.

Este ano, mais uma vez, o ex-presidente inventou uma novidade que foi a de ampliar o número de participantes do campeonato estadual, que a imprensa da capital insiste em chamar de Campeonato Carioca. Entendo o charme do nome, mas rechaço o preconceito. Todos os demais estados já assumiram seus campeonatos como sendo estaduais, com suas vantagens e desvantagens.

Pois bem, foi aprovada a idéia da se criar uma “Seletiva” para selecionar mais quatro times que ano que vem, se somam aos doze já classificados para disputar o estadual. Tenho dúvidas se isso é bom para o futebol estadual, mas, considerando o fato de ser um campeonato curto e que a ampliação do número de clubes movimentaria mais times, significando mais preparação de atletas, mais movimentação de recursos e o fato do Goytacaz ter nova chance, pessoalmente, aceitei.

As coisas estavam indo bem até à morte do Eduardo Viana. No seu lugar, assume, um sujeito chamado Rubens não sei lá das quantas, que a exemplo do Caixa-1, diz não se importar que divulguem que a sua maior preocupação é o seu time de coração, o Bangu, que já anunciou que disputará esta mesma seletiva, com o time inteiro do Madureira. Conhecem o estilo?

Tudo ainda continuaria bem, se as decisões tomadas pelo Caixa-1 continuassem valendo. Com a morte e a assunção do Caixa-2, sem trocadilho (Caixa-2, de Caixa D’água-2) o mesmo patrocina uma ação, cujo interessado, teoricamente, teria sido o time da Universidade Estácio de Sá. Aqui mais um parêntese: a Unesa recentemente dispensou uma leva enorme de professores e coordenadores, em seus diversos “campus” com o argumento da reengenharia e do corte de despesas, ao mesmo tempo em que resolve bancar um time de futebol, fecha o parêntese.

A partir da liminar concedida pela Justiça na ação movida pela Unesa, o Caixa D’água-2, se aproveitou para suspender o campeonato que começaria dois dias depois. Em seguida, suspendeu todas as decisões tomadas com os clubes na reunião da Federação, chamada de Arbitral – aquela que ao final, o Eduardo passou mal e faleceu - para reformular o campeonato, ao seu molde, ou melhor, ao interesse do Bangu. Sozinho, decidiu acrescentar mais dois times na seletiva, dividiu-os em grupo, acabou com a idéia do campeonato de pontos corridos, colocou times fortes para se enfrentarem no mesmo grupo, preparando desta forma, a situação que deseja para o seu Bangu, que na verdade é o Madureira, para estar entre os quatros finalistas da seletiva.

Triste sina esta do meu time. Sofreu com o Caixa-1 e agora com o Caixa-2. Afinal, só resta torcer. Bem diz, meu velho e dileto amigo Bagueira, que é melhor torcer para o Goyta, na já tradicional “segundona”, com seus jogos aos sábados à tarde, ganha um, perde outro, cria a expectativa de poder subir, reclama da perseguição, dos juízes, etc., do que ser massacrado na primeira divisão e assim, se vai levando a vida. Enfim, como para efetivamente ser, toda a sina e regra, precisam ter exceção, quem sabe não vai ser desta vez. Dá-lhe Goyta!

Publicado na Folha da Manhã em 01 de outubro de 2006.